A posição de uma escola no ranking do Enem não deve ser o principal
fator considerado pelos pais ao decidir onde matricular os filhos.
A opinião é de José Francisco Soares, professor de educação da
Universidade Federal de Minas Gerais.
Para ele, há muitas escolas que tentam se apropriar da importância
preponderante da família para o desempenho dos alunos.
De acordo com Soares, "os fatores que estão fora da escola
respondem por mais de 70% do desempenho" dos estudantes.
Folha - O Enem deve ser usado para comparar escolas?
José Francisco Soares - Eu acho
que os resultados da Prova Brasil, do Enem são importantes porque mostram que
há alunos que aprenderam e outros que não aprenderam. Esse retrato é muito
importante. Entretanto, o que não é correto é você atribuir apenas à escola o
bom desempenho do aluno. Não é correto a escola não reconhecer a importância da
família.
Folha - Suas pesquisas mostram que as características pessoais e da
família respondem por fatia grande do desempenho dos alunos, certo?
J F S - Exato. O que a criança
leva de casa é muito mais determinante do que o que a escola consegue
acrescentar. Quem não tem uma boa escola pode não avançar. Mas as escolas não
podem riscar a contribuição das famílias. Os números e os resultados variam,
mas se você pega o aluno sem fazer nenhuma consideração, os fatores que estão
fora da escola respondem por mais de 70% de seu desempenho.
Folha - Se uma criança de família com alta escolaridade for para uma
escola ruim, terá o mesmo resultado do que se tivesse ido para uma escola boa?
J F S - Não, porque também importa
com quem essa criança vai conviver. Se ela fosse para uma escola pública de
baixa qualidade, não perderia seu capital cultural, mas, como iria conviver com
pessoas que levam menos, seus resultados seriam puxados para baixo. Ou seja, a
contribuição do grupo de alunos para o desempenho de um deles também é
relevante.
Parte do
sucesso das escolas que ficam muito bem nos rankings não é o sucesso
pedagógico. É o sucesso na atração do aluno com grande potencial de
aprendizagem.
Folha - E qual fator pesa mais?
J F S - Essas escolas são melhores
no marketing do que pedagogicamente. Isso não quer dizer que não sejam boas
pedagogicamente. Elas têm tudo muito bem estruturado, coordenador pedagógico
que sabe o que está falando, professores muito qualificados. Isso tudo é
correto, mas não elimina a enorme vantagem que ela tem por ser bem-sucedida na
seleção dos alunos.
A crítica
ao ranking é que ele elimina algo que está na escola, mas veio da família e de
que a escola se apropriou indevidamente.
Folha - O que a família deve buscar dentro de suas possibilidades? Como
deve escolher a escola dos filhos?
J F S - A primeira coisa é que ela
perceba que tem muitas opções. A posição das escolas nos rankings é importante,
mas não é o elemento que deve predominar. Em primeiro lugar, porque a diferença
de desempenho entre as boas escolas é muito pequena.
Além disso,
a condição em que algumas dessas escolas se encontram é fruto de políticas
detestáveis, que não são educacionais. A política de você atrair só o bom aluno
é detestável socialmente.
A outra
coisa que precisa ser considerada é que, obviamente, há muitos alunos acima
assim como muitos alunos abaixo da média da escola. Acho que é importante que a
família procure saber que notas tiraram os alunos da escola que têm os piores
resultados.
Folha - Com essa informação, você consegue se perguntar: e se meu filho
for pior nessa escola?
J F S - As escolas que vão bem nos
rankings colocam um foco muito grande no desempenho dos alunos?
Sim, essas
escolas só veem o desempenho do aluno. Seria importante que olhassem outras
competências. E os pais precisam saber o que querem para a educação dos filhos.
Se a família quer que o filho tenha um sentimento de empreendedorismo, uma
escola com foco muito grande em desempenho pode ser ruim para essa dimensão.
(Jornal da Ciência 4865, de 29 de novembro de 2013